domingo, abril 10

Gelosia

"A gente faz hora, faz fila na vila do meio-dia
Pra ver Maria
A gente almoça e só se coça e se roça e só se vicia
A porta dela não tem tramela
A janela é sem gelosia"




Gelosia...
Esta palavra no meio da canção Flor da Idade, de Chico Buarque, sempre me intrigou e fascinou.
Gelosia...
Onde Chico foi encontrar inspiração para abrigar uma palavra tão pouco usada e tão diferente?
Provavelmente durante o tempo em que viveu na Itália.
Gelosia em italiano quer dizer ciúme.
Jealous do inglês e Jalousie do francês também...

Segundo o site Polemikos, a origem da palavra gelosia vem do árabe. A gelosia evita que quem está atrás da janela seja visto por quem está de fora. Os maridos árabes usavam esta janela nos quartos de suas mulheres para não deixar que elas fossem vistas por outros homens.
Conversa vai, conversa vem...
E gelosia virou sinônimo de ciúme. 

Janela sem gelosia. Chico tem essa incrível habilidade de colocar um humor no meio de suas letras.
Confesso, tenho muita  dificuldade em colocar em letras de músicas esse toque de humor.
Em textos e crônicas é fácil, mas em letras...
Talvez ache que a música é uma coisa mais séria.

Na música em questão, Chico abusa do direito de ser criativo. Brinca com palavras pouco usuais em poemas, como fila, tramela, coça, pijama, rádio de pilha e por aí vai, encadeando versos, tendo como mote a associação a uma garota entrando na flor da Idade.
No final faz uma referência, ou melhor, uma deferência ao poema Quadrilha de Carlos Drummond de Andrade.

Uma simples palavra, e me levou pelo mundo árabe, pela opressão feminina, ciúme, filmes, músicas, etimologia das palavras, livros, blogs...
Uma simples palavra e gerou muitas, muitas, muitas outras...
Queremos desvendar o universo mas há tanta coisa pra se saber em um grão de areia...



Letra de “Flor da Idade”

A gente faz hora, faz fila na vila do meio-dia
Pra ver Maria
A gente almoça e só se coça e se roça e só se vicia
A porta dela não tem tramela
A janela é sem gelosia
Nem desconfia
Ai, a primeira festa, a primeira fresta, o primeiro amor

Na hora certa, a casa aberta, o pijama aberto, a família
A armadilha
A mesa posta de peixe, deixa um cheirinho da sua filha
Ela vive parada no sucesso do rádio de pilha
Que maravilha
Ai, o primeiro copo, o primeiro corpo, o primeiro amor

Vê passar ela, como dança, balança, avança e recua
A gente sua
A roupa suja da cuja se lava no meio da rua
Despudorada, dada, à danada agrada andar seminua
E continua
Ai, a primeira dama, o primeiro drama, o primeiro amor

Carlos amava Dora que amava Lia que amava Léa que amava Paulo
Que amava Juca que amava Dora que amava
Carlos que amava Dora
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava
Carlos amava Dora que amava Pedro que amava tanto que amava a filha
Que amava Carlos que amava Dora que amava toda a quadrilha



Link Poema quadrilha Carlos Drummond
http://www.jornaldepoesia.jor.br/drumm11.html
Aqui uma nota sobre a música Flor da Idade por Humberto Werneck 
http://www.chicobuarque.com.br/letras/notas/n_flordaid.htm,
Uma das músicas que se utiliza, em inglês, da palavra jealous: Jealous Guy (cara ciumento) de John Lennon:
http://www.vagalume.com.br/john-lennon/jealous-guy-traducao.html,
Video do filme vai trabalhar vagabundo:
http://www.youtube.com/watch?v=hs5QNEGsh00




5 comentários:

Mariana Gouveia disse...

Uma doce surpresa,Flávio.Na voz deliciosa de Chico e a explicação.
Chico de múltiplas faces,de voz que encanta.Acabando de ler Leite derramado,havia ouvido Tatuagem e ao abrir teu blog...ah,o primeiro impacto,o primeiro ato e o encanto ficou.

Flávio Colares disse...

Parece que nada é por acaso, não é mesmo Mariana?
Por vezes a vida parece seguir um enredo pré-determinado...
Por vezes nem dá pra acreditar...

Foi muito bom a gente ter se encontrado na blogosfera, e é
muito bom saber que tão sensível artista como você acompanha meus posts.
Um abraço!!!

Raquel Amarante disse...

Poço fundo de erudição e cultura, você, Flávio..
BjO

Flávio Colares disse...

Erudição e cultura? São seus olhos minha querida Raquel.

Somente sou um apanhador num campo de centeio...
O campo é o mundo, o centeio são as palavras que estão por aí soltas...

Bjo

Raquel Amarante disse...

Bom apahador, vc, então.

bjo

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